Sob pressão política, Banco Central arrisca credibilidade
Não foi uma total surpresa, mas o mercado recebeu com um certo espanto a decisão do Banco Central de manter os juros em 14,25% ao ano. Isso porque depois de idas e vindas em sua comunicação, não subir os juros abre brecha para que autoridade monetária seja acusada de ceder a pressões políticas, colocando ainda mais em xeque a sua credibilidade.
“Pela frente vai ter deterioração adicional das expectativas de inflação e o Banco Central tem sua credibilidade comprometida”, afirma Ignácio Crespo Rey, economista da Guide Investimentos. Ele alterou, nesta semana, sua projeção de alta de 0,50 ponto percentual na Selic para subida de 0,25 ponto depois que Alexandre Tombini, presidente do BC, sinalizou ontem que talvez pudesse subir menos os juros.
O fato de Tombini ter se reunido, na segunda-feira (18), com a presidente Dilma Rousseff, em um encontro fora da agenda oficial de ambos, foi interpretado pelo mercado como mais um fator de pressão política sobre o presidente do BC, já que, depois que Joaquim Levy deixou o Ministério da Fazenda, no fim do ano, as baterias do PT voltaram-se contra Tombini.
Coincidência ou não, na manhã seguinte, o BC surpreendeu o mercado, ao emitir uma nota afirmando que “todas as informações relevantes” seriam consideradas para a decisão do Copom. O pretexto foi a piora da expectativa do FMI para a economia brasileira. O mercado entendeu o recado como mais “dovish” (a favor da queda dos juros).
Digitais
“Diante das sinalizações do Banco Central, não foi uma boa decisão. Aparentemente tem a digital do Planalto; isso já aconteceu outras vezes na gestão Dilma 1 e volta a ocorrer", avalia Juan Jensen, sócio da 4E Consultoria.
Até então, o BC vinha, por meio de seus documentos e discursos, com um tom “hawkish” (inclinado à alta dos juros), direcionando as expectativas do mercado para uma elevação da Selic em 0,5 ponto com o intuito de garantir que a inflação atinja a meta do governo (4,5%) em 2017.
“Essa decisão afeta a credibilidade do BC no mercado, porque sempre haverá dúvidas se a decisão foi tomada com base na convicção da autoridade na recessão ou se houve pressões políticas”, comenta Paulo Gomes, economista-chefe da Azimut Brasil Wealth Management.
A economista sênior do Santander, Tatiana Pinheiro, diz que ainda é cedo para avaliar como a decisão de hoje vai impactar a imagem do BC. Segundo ela, o comunicado foi claro e muito compreensível ao ressaltar a piora e a volatilidade do mercado.
“É válida a preocupação com a atividade econômica. Isso sinaliza que, muito provavelmente, houve uma mudança para pior na expectativa da atividade econômica. Se for nessa linha da atividade, a credibilidade do BC ficará no mesmo nível. Mas, se a ata for muito vaga sobre a expectativa para a atividade, ou se não houver alteração nisso, pode ficar comprometida”, afirma.
Reação do mercado
O mercado de juros futuros deve fazer ajustes nesta quinta-feira (21) após a decisão, já que projetava uma alta de pelo menos 0,25% ponto na Selic. Segundo Tatiana, vai haver mudanças tanto nos contratos com vencimentos mais curtos quanto nos mais longos, uma vez que havia uma expectativa de ajuste longo de juros. “Amanhã, o mercado vai desprecificar a expectativa”, afirma.O economista da Azimut avalia que a tendência é que o dólar se aprecie, e não apenas por uma percepção de risco maior. “O investidor estrangeiro olha a inflação subindo e os juros não acompanhando. Com isso o juro real cai e ele tira o dinheiro do país”, afirma.
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